Crédito: Definição, Finalidade, Origem, Evolução, Teorias e Análise.
- Bruno Ferreira Shinya
- 21 de jun. de 2023
- 32 min de leitura
Atualizado: 11 de ago. de 2023
Utilize o crédito com controle e sabedoria. Aprenda mais abaixo!
* Por Bruno Ferreira Shinya

Vivemos atualmente em um mundo globalizado e em um período muito conturbado da nossa história, em que as pessoas possuem uma variedade de problemas e necessidades ilimitadas frente aos recursos limitados e que às vezes são escassos. Como diz a definição de economia dos economistas Stonier e Hague: “Não houvesse escassez nem necessidade de repartir os bens entre os homens, não existiriam tampouco sistemas econômicos nem economia. A economia é, fundamentalmente, o estudo da escassez e dos problemas dela decorrentes.” (ROSSETTI, 1991) E observa-se que para fazer frente a essas situações, em que manter as contas em dia, ou mesmo para poder ter um crescimento por meio de investimento, é necessária em muitas vezes a decisão da tomada de crédito.
A palavra crédito vem do latim creditum, que significa dar confiança. Em termos de economia, crédito se refere a “cessão de mercadoria, serviço ou dinheiro, para pagamento futuro”.
Neste texto, será discorrido um pouco sobre crédito: o que é, a sua finalidade, a sua origem, a evolução, as teorias e a abordagem de análise.
O que é Crédito? (Definições)
A palavra crédito vem do latim creditum, que significa dar confiança. Segundo a definição do Mini Dicionário Aurélio (2000), (terceira definição do vocábulo), em termos de economia, crédito se refere a “cessão de mercadoria, serviço ou dinheiro, para pagamento futuro”.
Silva (2008) definiu crédito, no sentido restrito da palavra, como sendo um valor presente determinado mediante o pagamento de uma promessa futura. Já a definição, em finanças, ainda segundo Silva (2008), crédito está relacionado a um “instrumento de política a ser utilizado por uma empresa comercial ou industrial na venda a prazo de seus produtos...”.
Santos (2011) descreve crédito como referindo “à troca de um valor presente por uma promessa de reembolso futuro, não necessariamente certa, em virtude do “fator risco”.”
Já o significado de crédito, descrito por Perera (2013), trata-se de uma transação em que um indivíduo recorre a outro indivíduo para tomar recursos a fim de satisfazer uma necessidade ou uma conveniência, de modo que ao final de um período estabelecido devolver o valor cedido.
Securato (2002) descreveu o crédito como sendo “uma relação de confiança entre duas (ou mais) partes numa determinada operação”. E que ainda propicia a facilidade da compra e da venda de serviços ou produtos, o qual está presente no dia a dia das pessoas.
Ainda segundo Securato (2002): o crédito configura como uma operação intertemporal, como descrito pela teoria clássica, em que um indivíduo ou uma empresa com base no sacrifício de seu consumo presente realiza uma operação de transferência de recursos para o tomador por um determinado tempo acordado e que possui um custo, que é baseado por uma taxa de juros.
Securato (2002) classifica e denomina o crédito como “uma operação de empréstimo que sempre pode ser considerada dinheiro, ou caso comercial equivalente a dinheiro, sobre o qual incide uma remuneração que denominamos juros”.
Perera (2013) ainda destaca os benefícios e as consequências más providos do crédito. Quanto aos benefícios, há a possibilidade de se desenvolver nações e também o “aumento da riqueza de indivíduos, empresas e países.” Já as consequências perversas do crédito resumem-se a falência e a crises econômicas, no caso de má utilização ou condução do mesmo.
Finalidade do crédito
A finalidade do crédito destina-se a atender as reais necessidades tanto das pessoas físicas, quanto das pessoas jurídicas.
Segundo Santos (2011), para isso, deve conhecer detalhadamente o tomador de crédito, principalmente quanto à situação patrimonial e financeira, a fim de que seja oferecida uma modalidade de crédito adequada e compatível com as necessidades de financiamento e capacidade de amortização da dívida.
As necessidades variam com o prazo solicitado e a forma em que o recurso será direcionado ou aplicado.
Conforme Santos (2011):
No curtíssimo prazo, o crédito será destinado basicamente e principalmente para poder atender a uma demanda imediata de recursos emergenciais, sendo estes voltados para cobrir possíveis desequilíbrios orçamentários (no caso de pessoas físicas) e descasamentos de caixa (no caso de pessoas jurídicas – desequilíbrios devido aos prazos de recebimento e de pagamento, ocorridos por poucos dias).
Já no curto prazo, o crédito será direcionado para o financiamento de compras (no caso de pessoas físicas – visando atender a aquisição de produtos e de serviços para consumo e também ligados ao bem-estar, por exemplo: eletrodomésticos) e para financiar o ciclo operacional, que se trata desde a aquisição de matérias-primas e insumos até a venda dos produtos finais (no caso de pessoas jurídicas), além de pagamento de tributos, de funcionários e a fornecedores.
Por último de longo prazo, o crédito visa a promover os investimentos, os quais permitem a aquisição de bens de maior valor de modo que faça a formação ou o incremento do patrimônio (no caso de pessoas físicas) como imóveis, veículos, máquinas e equipamentos; e para financiar o imobilizado (no caso de pessoas jurídicas – instalações, veículos, máquinas e equipamentos).
A forma de pagamento costuma ser única para o curtíssimo prazo, única ou parcelada (em até 12 meses) no curto prazo e parcelada no longo prazo (acima de 12 meses).
Quanto às modalidades de crédito (empréstimos e financiamentos) serão discorridas e tratadas em outro artigo.
Origem do crédito
Conforme Perera (2013), “a origem do crédito pode ser encontrada na antiga Assíria, Fenícia e Egito.” Por volta de 1.800 a.C., Hammurabi, o rei da dinastia da antiga babilônia, “instituiu o primeiro código formal de leis”, e dentro desse, havia princípios que “tratavam das relações do devedor para o credor”. Nessa época, “todos os empréstimos eram registrados por escrito em contratos, referendados na presença de funcionários públicos.” Além disso, já era notável a existência da garantia de penhor, em que era possível penhorar terras, bens móveis, a própria pessoa do devedor, bem como também de sua família (esposa, concubina, filhos e escravos – sendo que a escravidão por débito poderia ser limitada em no máximo 3 anos).
Pelo ano de 1.300 a.C., nos empréstimos, os babilônios e assírios utilizavam garantias de hipoteca, fianças e adiantamentos de depósitos, sendo que estas garantias eram devidamente documentadas.
“Pelo ano 1.000 a.C., os babilônios já faziam remessas para praças distantes de pagamentos de dívidas entre comerciantes.” (PERERA, 2013)
No século XII, havia três povos que competiam pela atividade de crédito: os judeus, os lombardos e os catalães (especificamente do reino de Aragão, na Espanha).
Evolução do crédito
A evolução do crédito não é um processo normal que as pessoas geralmente pensam, e para que o crédito se tornasse uma atividade mais comum e praticada, consequentemente teve que enfrentar alguns obstáculos na Antiguidade, como a inexistência de “meios legais para propiciar um ambiente de segurança e de ordem privada” e o preconceito, bem como a rigidez que os povos antigos possuíam, em que definiam que o crédito era considerado pecaminoso, sendo “...uma atividade malvista, condenada pela religião” e de “risco extraordinário”. (PERERA, 2013)
Até o ano de 1300, era proibido pela a Igreja Católica o pagamento de juros decorrentes de operações de empréstimos, ou seja, neles não era considerada a usura (do latim e que significa o uso de qualquer coisa).
Na época do imperador romano Justiniano I (denominado como Justiniano, o Grande), século VI d.C., mesmo com a expansão da atividade dos banqueiros, as atividades creditícias ainda eram poucas devido não satisfazerem as necessidades mercantis nesse período, por haver baixa quantidade de dinheiro e também pela “falta de efetividade de ação do credor contra o devedor” e pelas altas taxas cobradas desses empréstimos que eram praticadas. (PERERA, 2013)
Já na Idade Média, com o advento do notável desenvolvimento mercantil, as operações de crédito começaram a tomar forma, contudo de uma “maneira lenta, moderada e desprovida de qualquer regulamentação legal” e sem lastro em relação aos depósitos em custódia (das pessoas-clientes) nos bancos. (PERERA, 2013)
Entretanto, a partir da Renascença, que realmente o crédito passou a tomar força, com cada vez mais emprestadores, inclusive com famílias especializadas tornando-se grandes banqueiros, como a dos Médici (no século XV) e a dos Rothschild (no século XVIII), graças ao fato de que a moeda (ou dinheiro) tornou-se nesta época meio de troca e que o próprio dinheiro passou a fazer parte de um processo de geração de cada vez mais dinheiro.
O volume de crédito foi aumentando com “à medida que as operações bancárias (...) atingiam estágios mais elevados de organização e de desenvolvimento, sentia-se a necessidade de criar instituições mais poderosas que dessem mais garantias aos depositantes”. (PERERA, 2013)
Entre os comerciantes, o crédito se dava inicialmente e exclusivamente com a finalidade de poder dar ajuda recíproca, porém não na forma monetária e sim através de mercadorias que eram emprestadas por outro comerciante e com o objetivo único de poder suprir uma falta momentânea de mercadorias (do tomador), mas que no final o tomador pagava em espécie.
Isso também ocorreu com as operações entre os agricultores, que tomavam em determinadas ocasiões, principalmente para atender uma necessidade sazonal, antes que pudesse ser efetivamente ser feita a colheita de seus produtos, sendo que o valor era reintegrado ao credor somente após ser vendida a produção (do tomador). Durante esse período – ou seja, a fase do crédito – “mantinha-se o compromisso de pagamento, como um simples dever e não como relação contratual”. (PERERA, 2013)
De modo que nestas operações acima, não havia a incidência de juro(s).
Passado uns tempos, o crédito entre os comerciantes converteu-se em operação comum (mercantil, lucrativa) e não seria mais com base em amizade ou uma simples ajuda em um período de necessidade. Sendo assim, o crédito se tornou um meio de poder haver a ampliação dos negócios ou até de conseguir um lucro devido a cobrança de um preço maior pela venda de mercadorias. Nisso, já ocorria a inserção do juro nas operações de crédito.
Nessa época acima mencionada, tinha alguns contratempos visto que esses comerciantes realizavam as operações de crédito com base na confiança em seus vizinhos, pautando não só pelo potencial econômico e de pagamento, mas também observando a honradez e o conceito comercial destes últimos, além da questão relacionada à localidade (não poderia e deveria ser para locais longes porque possuía o risco de perder toda a mercadoria emprestada e consequentemente o valor a ser pago em espécie – dinheiro).
Logo, houve a evolução das operações, em que os comerciantes empresários passaram a procurar contatos de outros comerciantes em mercados mais distantes, sendo que para isso teve que buscar informações destes últimos com pessoas próximas deles, de modo que com as informações coletadas assegurassem que as obrigações creditícias fossem cumpridas, e assim o crédito fosse concedido. E assim pudesse fazer com que o risco fosse um pouco menor.
Outro ponto que impedia um desenvolvimento maior do crédito era o fator do pagamento, que dependia de grandes quantidades de numerário de um lugar para outro. Mas isso foi resolvido com o surgimento da letra de câmbio, a qual inicialmente era similar aos cheques usados em nosso momento presente e “servia para ordenar o pagamento de uma dada quantia a uma determinada pessoa, em lugar distinto daquele em que residia o comprador.” E, além disso, oferecia uma nova vantagem, que era “a possibilidade de cobrar antecipadamente as dívidas, mediante a venda dos títulos que as representavam.” (PERERA, 2013)
As letras de câmbio representaram um instrumento importante para a expansão do crédito. E a partir disso, logo depois, elas passaram também a serem descontadas nas feiras cambiárias (estas tinham data e local onde as letras de câmbio poderiam ser negociadas).
Já com relação ao crédito ao consumidor, Perera (2013) destacou que a sua evolução foi decorrente de operações de maiores valores, as quais posteriormente passaram a serem formalizadas através de um título de crédito e que também visava ao atendimento das necessidades dos tomadores comerciantes, de forma que pudessem “estender os prazos de venda dos artigos com preços mais elevados”.
Essas operações de crédito referiam-se para intermediar as vendas a prazo dos comerciantes de seus artigos que tinham um valor grande no mercado, e que mesmo após de as vendas terem sido efetuadas, os artigos ainda possuíam “um valor que podia ser recuperado”, mediante a revenda dos mesmos. Nesta época, bens como móveis, máquinas de costura, pianos e livros eram vendidos deste modo. (PERERA, 2013)
Com o passar do tempo e devido à naturalidade que as operações a prazo se consolidaram no mercado, houve o surgimento de empresas de crédito, que eram especializadas inicialmente em operações de desconto de títulos, e que logo passaram a conceder operações de créditos diretos individuais. Nos Estados Unidos, em 1907, A. J. Morris fundou os bancos que levavam o seu nome. (PERERA, 2013)
Já na Inglaterra, o crédito tinha como objetivo financiar as viagens de mercadores para as colônias. Nessa época, as taxas de juros elevadas não podiam ser abusivas por causa da lei da Usura, sendo assim taxas moderadas de juros eram desejáveis e praticadas. Além disso, naquela época havia escassez de dinheiro devido ser limitado pelo governo colonial. E também é sabido que um dos objetivos para administrar as colônias era a busca principalmente de metais preciosos, como o ouro e a prata. (PERERA, 2013)
A fundação do primeiro banco nos Estados Unidos deveu-se a Alexander Hamilton, o qual “consolidou o débito nacional, desenvolveu o sistema monetário” e assim pôde estabelecer o Bank of United States, “que se tornou o agente fiscal do governo”. E “o crédito bancário nesse período ocorreu sob a forma de notas bancárias”. Depois disso, o Congresso americano regularizou o sistema nacional bancário por meio da National Banking Act (1863) e assim “as notas bancárias foram substituídas pelas notas bancárias do sistema nacional e por dinheiro do governo dos Estados Unidos”. (PERERA, 2013)
Posteriormente, com à medida do tempo, foram criadas as agências de crédito, que tinham a função de vender relatórios de crédito para seus subscritores.
O crédito evoluiu em termos de quantidade e de qualidade em decorrência da rápida expansão industrial e comercial, que inclusive proporcionou o aumento das facilidades de crédito. Foram criados os bancos comerciais, os bancos de investimento, sociedades de poupança, companhias seguradoras, companhias financeiras, factorings e outras atividades relacionadas. (PERERA, 2013)
Com isso, o crédito ao consumidor tornou-se um dos principais meios de financiamento ao consumo por tornar disponível para as classes média e inferiores a aquisição de muitos produtos e bens, além de estimular aos empresários a produção em massa e também “a distribuição de bens de elevado valor, como automóveis, casas, equipamentos domésticos, barcos e uma incontável série de outras comodidades”. (PERERA, 2013)
Teorias sobre Crédito
Há 3 teorias econômicas que discorrem sobre crédito, as quais são:
• Clássica;
• Keynesiana;
• Pós-keynesiana
Teoria Clássica
Segundo Froyen (1995): “na teoria clássica, a taxa de juros era aquela que garantia que o montante de fundos que os indivíduos desejavam emprestar fosse exatamente igual ao montante que os outros indivíduos desejavam tomar emprestado.”
“A taxa de juros mede (...) o custo de tomar um empréstimo.” (FROYEN, 1995)
Sendo assim, pode-se inferir que o mercado de crédito está baseado na relação entre a taxa de juros e a oferta e a demanda por títulos.
Além disso, o papel explícito dos componentes da demanda agregada (consumo, investimento e gastos do governo) se expõe na determinação da taxa de juros de equilíbrio.
No modelo clássico, os ofertantes de títulos (ou demandantes de crédito) eram as empresas (ou firmas) e o governo, que são os responsáveis pelo investimento agregado da economia. Para poderem realizar os seus dispêndios de capital e assim seus projetos de investimento, as firmas faziam através pela venda de títulos.
E o governo para financiar as despesas que excederiam as receitas providas da arrecadação de impostos também realizavam as vendas de títulos.
“No modelo clássico, o nível de investimento das empresas era uma função da rentabilidade esperada dos projetos de investimentos e da taxa de juros. A rentabilidade esperada dos projetos de investimento, por suposição, variava de acordo com as expectativas relativas à demanda por produtos durante esses projetos, estando sujeitas a mudanças exógenas.” (FROYEN, 1995)
As empresas (ou firmas) possuíam um determinado número de projetos de investimento, as quais ofereciam retornos esperados diversos. Com isso, baseavam a classificação desses projetos conforme as magnitudes dos retornos esperados. “A taxa de juros representa o custo de tomar recursos para financiar esses projetos de investimento”. Logo, os investimentos variam inversamente à taxa de juros, ou seja, quanto maior a taxa de juros, menos projetos de investimento teriam e, quanto menor a taxa de juros, mais projetos tornar-se-iam lucrativos e assim aumentaria os investimentos das empresas. (FROYEN, 1995)
Já pelo lado da oferta, há os poupadores (ou concedentes de empréstimos). “No modelo clássico, a poupança era considerada como uma função positiva da taxa de juros”.
Dois importantes economistas escreveram a respeito sobre o uso do crédito, que são Irving Fisher (economista neoclássico) e Knut Wicksell.
Irving Fisher foi um dos pioneiros no estudo e na formulação das teorias sobre consumo e investimento intertemporal. Por meio de sua teoria sobre a liquidez (Theory of Interest) em 1930, Fisher analisou o comportamento de consumidores e de investidores ou poupadores com relação à preferência ou decisões entre consumir e poupar no tempo e a consequente verificação das taxas de juros, em um livre mercado.
Conforme Perera (2013), nesta linha clássica de pensamento econômico, por meio de Fisher, a economia era movida pelas decisões dos indivíduos com base em suas preferências entre consumir e poupar no tempo, isto é, no presente e no futuro. E a poupança ou o ato de poupar dos agentes superavitários proporcionava no mercado monetário os recursos necessários para que os empresários pudessem realizar os seus projetos de investimento.
Perera (2013) relacionou 3 variáveis importantes na decisão de poupar dos indivíduos (segundo Fisher):
1) A taxa marginal de preferência pelo tempo, que é “expressa pela vontade dos indivíduos de transferir parte do consumo atual para o futuro”.
2) A renda dos indivíduos;
3) “A recompensa por poupar ou a taxa de juros que os tomadores estarão dispostos a pagar pelos fundos tomados por empréstimos”.
Observando também que a taxa marginal de preferência varia de indivíduo para indivíduo; a renda influencia no volume de poupança, sendo que rendas maiores poderão fazer com que as pessoas aumentarão suas poupanças; e taxas de juros mais altas induzirão indivíduos a poupar mais e consumir menos no presente, de forma a poder consumir mais no futuro.
Knut Wicksell
Knut Wicksell procurou formular em sua época uma teoria monetária que fosse mais adequada para explicar a dinâmica da moeda e a influência das taxas de juros e de empréstimo, diferentemente da teoria clássica (TQM - Teoria Quantitativa da Moeda) e da teoria neoclássica.
Estudou a fundo sobre isso e que ele mesmo desenvolveu, o que ficou conhecido como processo cumulativo de Wicksell. Analisou em uma economia de moeda pura, em uma economia de crédito puro e em uma economia mista (de moeda e crédito). (CARVALHO et al, 2007)
O processo cumulativo de Wicksell considera dois mecanismos de transmissão monetária: o direto e o indireto. (CARVALHO et al, 2007)
O mecanismo direto se dá quando há um efeito de um “aumento da oferta da moeda diretamente sobre a demanda por bens”. (CARVALHO et al, 2007)
Já o mecanismo indireto ocorre devido à “relação entre a demanda por moeda (e sua velocidade) e a taxa de juros, na qual um aumento (diminuição) na oferta de moeda reduz (aumenta) primeiro a taxa de juros, elevando-se depois a demanda por bens, causando então um aumento (diminuição) do nível de preços.” (CARVALHO et al, 2007)
Em seu livro Lições de Economia Política, Wicksell descreveu que nas relações entre as pessoas principalmente no mercado monetário, haveria (ou existiria) dois tipos de taxas: as taxas de juros e as taxas dos empréstimos. (CARNEIRO, 1997)
A taxa de juros (do dinheiro) refere-se quando houver o equilíbrio entre a oferta e a demanda de capital, a qual é regida pela poupança formada dos lucros provenientes dos investimentos dos empresários e pelos empréstimos tomados pelos demandantes de dinheiro a fim de se fazer os investimentos. Knut Wicksell concorda com essa conceituação de Adam Smith e David Ricardo. (CARNEIRO, 1997)
As taxas de empréstimos podem variar de acordo com a propensão e disponibilidade de fundos dos ofertantes frente ao tempo dos empréstimos e o valor que cobrirá e terá uma superposição ao valor concedido (como se fosse uma garantia). (CARNEIRO, 1997)
Além disso, as taxas de juros de empréstimos flutuariam, de forma a tendência de se chegar a taxa natural (ou normal) de juros.
Quando as taxas de empréstimos são mais baixas do que as taxas de juros normais, isso acabará impactando na poupança, provavelmente levando a um desestímulo, o qual “se produzirá um aumento da demanda presente de bens de consumo e de serviços”. Com isso, sinalizará aos empresários uma expectativa maior de obtenção de maiores lucros. Além disso, os trabalhadores, os proprietários de matérias-primas e os proprietários de terra também terão uma maior renda, e assim conduzirão ao consumo, estimulando a demanda, e com uma oferta reduzida, acarretará em uma subida de salários e consequentemente dos preços dos bens e serviços. Na parte monetária, uma maior demanda monetária se verificaria devido aos empresários concorrerem pela mão-de-obra disponível, bem como pelas matérias-primas e terra ou imóveis (ou seja, pelos fatores de produção). (CARNEIRO, 1997)
Sendo assim, de maneira que os preços baixem e voltem a um nível de equilíbrio, é necessário que as taxas de juros voltem ao seu nível normal.
Já quando as taxas de empréstimos são mais altas do que as taxas de juros normais, ocorreria o movimento inverso, haveria um fluxo de circulação de moeda (dinheiro) afluindo aos bancos, de maneira a aumentar o nível de poupança neles, e com isso reduziria a demanda presente de bens de consumo e de serviços. Aliado a isso, consequentemente haveria uma queda nos preços das mercadorias, devido a uma menor disponibilidade de recursos pelos empresários (visto que também os empréstimos se tornariam mais caros para os mesmos).
Wicksell também aponta que “a causa primária das flutuações de preços é a mesma, a saber, a diferença que surge entre as taxas de juros normais e as reais”. Isto é, ainda conforme Wicksell:
“A queda das taxas de juros por parte dos bancos faz com que subam os preços e a alta dos juros supõe que os preços desçam, mas unicamente quando a taxa de juros dos empréstimos cai abaixo ou sobe acima da taxa normal, o que, por sua vez, se acha relacionado com a taxa natural.” (CARNEIRO, 1997)
Wicksell descreve que em um sistema de crédito puro, há uma grande elasticidade na oferta de crédito, pois os bancos, além de dispor para emprestar os seus próprios fundos, podem ainda conceder como empréstimos e satisfazer a atenção de qualquer demanda dos mesmos devido ao montante derivado das poupanças de seus clientes, e ainda com baixas taxas de juros. (CARNEIRO, 1997)
Além disso, nesse sistema de crédito puro, não ocorreria movimentações em moeda manual, ou seja, segundo Wicksell, todos os pagamentos seriam realizados através de transferências, os quais seriam registrados nos livros bancários, e assim consequentemente, os bancos poderiam emprestar qualquer quantia de empréstimos a qualquer taxa de juro, inclusive por mais baixa que ela seja. (CARNEIRO, 1997)
Já a economia de moeda pura, não existiria saldos monetários nem contas bancárias, e a regulação do estoque e de circulação de moeda metálica ocorreria de acordo com a oferta e a descoberta de ouro. Caso houvesse esta última, a oferta monetária metálica aumentaria, e os indivíduos consequentemente teriam mais saldos reais disponíveis e um poder de compra excedente e com isso provocaria um aumento na demanda por bens e mercadorias no mercado. A consequência seria uma elevação no preço das mercadorias e bens. (CARVALHO et al, 2007)
Keynesiana
Keynes em seu livro A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda , através do capítulo XI, não falou explicitamente sobre o mercado de crédito, mas muitos estudiosos e cientistas apreendem deste capítulo, o qual este discorre sobre o conceito de eficiência marginal do capital, em que os empresários, no capitalismo, devem tomar as suas decisões com base nas expectativas de fluxo de caixa (recebimentos de suas vendas) e também da taxa de juros por meio da aquisição de bens de capital (investimentos em capital fixo).
Esses investimentos, os quais compõem uma parte da demanda agregada, segundo Keynes, é que possibilitam com que as empresas possam promover uma maior produção de seus produtos e assim atender a demanda (de consumo) da economia.
E como nem todos os empresários dispõem de recursos (em dinheiro/capital) imediatos, eles compram os bens de capital (máquinas e equipamentos) através do financiamento a longo prazo e pagando uma taxa de juros ao credor. E é justamente isto é que caracteriza e intensifica o mercado de crédito na economia keynesiana.
A eficiência marginal do capital corresponde à taxa de juros que torna igual (ou equilibra) o valor presente do fluxo de recebimentos promovido pelo bem de capital com o preço de oferta, ou seja, o preço da aquisição deste, ou no máximo o custo de reposição do bem de capital. (PERERA, 2013)
Pós-Keynesiana
Na abordagem pós-keynesiana foram introduzidas novas hipóteses no modelo, tais como: a não neutralidade da moeda no longo prazo (ou seja, a moeda não é um simples instrumento de conveniência, pois ela afeta as decisões e os motivos do próprio uso da mesma pelos agentes econômicos, utilizando principalmente a função de reserva de valor para o motivo especulação – diferentemente do motivo transação, usado mais no modelo clássico), a utilização da incerteza não probabilística inclusive para risco futuro e “a necessidade do estabelecimento de um sistema de contratos como um instrumento básico pelo qual os agentes alcançam algum tipo de coordenação perante o futuro incerto”. (CAVALCANTE, 2015)
Os bancos trabalham com a gestão e a administração de seus ativos e passivos, conforme em seus balanços, não atuando somente na demanda por moeda.
Quando ocorre o aumento no montante de depósitos bancários dos seus clientes, os bancos expandem a oferta monetária por meio da concessão de crédito aos agentes deficitários, os quais buscam esses recursos para fazerem e atenderem a sua demanda.
Conforme Paula (2006), os bancos baseiam-se suas decisões com base no seguinte modo:
“A volatilidade de suas avaliações sobre a riqueza financeira e suas expectativas quanto ao retorno dos empréstimos ocasionam flutuações na oferta de crédito e, consequentemente, nos níveis de investimento, produto e emprego na economia”.
As instituições financeiras também trabalham e operam com o trade-off liquidez versus rentabilidade. Pautam sobre isso com base na escolha da estratégia atuando na gestão e administração de seus passivos e ativos, utilizando a preferência pela liquidez quando possuem expectativas negativas e observam e projetam um cenário dificultoso e incerto no futuro, através da retenção de ativos líquidos (como títulos do governo) e com racionamento de crédito, praticando uma seletividade dos seus clientes na concessão do mesmo; e quando a economia está indo bem, os bancos expandem crédito através da captação maior de recursos monetários via depósitos em conta-corrente de seus clientes, e fazem isso diminuindo a seletividade na concessão do crédito (ou seja, praticando a seleção adversa) e ofertando financiamentos por um prazo mais longo ou empréstimos de mais alto risco, buscando uma maior rentabilidade e ganhos monetários do que preferindo liquidez.
Além disso, os bancos modernos atuam ativamente também na gestão de seus passivos de seu balanço (dados contábeis), isto é, por meio de alterações na composição do volume de depósitos de seus clientes (buscando o aumento deles devido a novos depósitos de clientes) e/ou de suas reservas, de maneira a tentar obter “vantagens das oportunidades lucrativas em seus negócios”. (PAULA, 2006)
Quando a economia está iniciando um período ou um ciclo de crise, os bancos reduzem suas expectativas de acordo com o fluxo de rendimentos esperado, isto é, há uma maior incerteza quanto ao futuro, sendo que as empresas também por terem expectativas negativas, acabam tendo um declínio em seus lucros, o que pode comprometer o retorno dos empréstimos bancários (na verdade, diminuindo). Neste cenário, os bancos fazem uma avaliação de risco dos tomadores de crédito. “Como o crescente risco percebido é incorporado ao prêmio de risco, os tomadores podem ser racionados via taxas de juros cobradas pelos (novos) empréstimos”.
Com isso, devido a essa mudança no comportamento dos bancos, na qual os mesmos procurarão diminuir os prazos médios das operações de crédito (em suas concessões) utilizando taxas de juros mais altas ou usando uma maior seletividade na concessão do crédito, em direção a uma maior preferência pela liquidez (diante desse quadro mais alto de risco). Além também de não haver mais a disposição de rolagem da dívida (passivo) das empresas, o que aprofunda ainda mais o cenário de crise econômica. (PAULA, 2006)
Aliado ao fato de que os bancos poderão, inclusive, a solicitar mais colateral (garantias) nessas operações, bem como buscar minimizar o “descasamento entre taxas e maturidades entre suas operações ativas e passivas”, de forma que “deverá caminhar na direção de ativos mais líquidos e menor risco”. (PAULA, 2006)
Ainda segundo Paula (2003), para tentar obter um melhor aproveitamento das oportunidades de administração dos recursos, tanto de seus ativos e de seus passivos, buscando maiores lucros nestas oportunidades, os bancos - em sua própria dinâmica – afetam “de forma decisiva na economia as condições e volume de financiamento” e impactam consequentemente nas expectativas e decisões de gasto/investimento dos demais agentes econômicos.
Análise de Crédito
O crédito é o processo econômico e financeiro que permite a transferência de recursos entre agentes superavitários (ofertantes de crédito) para os agentes deficitários (demandantes ou tomadores de crédito) na economia.
Conforme Santos (2011), a análise de crédito é o processo responsável pela avaliação e averiguação do cliente para ver se ele possui idoneidade, bem como capacidade financeira frente à amortização e consequente liquidação da dívida (empréstimo ou financiamento tomado).
Silva (2008) descreve que a informação é a matéria-prima para a análise e a decisão de crédito. Afinal de contas, sem informação ou mesmo tendo informação incompleta ou parcial, ficaria difícil de realizar uma boa e adequada análise de crédito de um cliente.
Ainda segundo Silva (2008): “A obtenção de informações confiáveis e o competente tratamento das mesmas constituem uma base sólida para uma decisão de crédito segura”.
Santos (2011) completa a frase acima mencionando que:
“O levantamento e a análise das informações básicas de crédito são requisitos fundamentais para a determinação do valor do crédito, prazo para amortização, taxa de juros e, se necessário, reforço ou vinculação de novas garantias”.
O processo de análise de crédito se dá primeiramente pela solicitação da proposta de crédito e passa pela busca das informações do tomador de crédito e posteriormente a avaliação dos dados, para assim poder-se chegar ao deferimento e conclusão da análise.
A primeira etapa ou fase da análise de crédito é coletar e conseguir as informações necessárias e que sejam efetivamente importantes para a análise de crédito por meio da ficha cadastral, seja para uma pessoa física ou para uma pessoa jurídica (empresa). E segundo Silva (2008) existem vários modelos de ficha cadastral e cada empresa deve elaborar a sua de acordo com a necessidade da solicitação de crédito ou devido ao tamanho e porte da empresa-cliente, visto que uma ficha cadastral solicitando muitos dados, além de dar muito esforço para preenchê-la, pode também irritar o cliente (tomador do empréstimo ou financiamento).
Para um cliente tomador de um volume menor de crédito, a ficha cadastral poderá ser mais simples e para clientes tomadores de grandes recursos ou volumes de crédito, o cadastro necessita ser bem mais completo. Silva (2008) ainda complementa que uma empresa poderá também elaborar uma ficha cadastral para todos seus clientes e ir alterando mediante a necessidade, setor de atuação do cliente ou para casos mais complexos.
Um segundo ponto também importante e merecedor de maior atenção é a análise de idoneidade, conforme Santos (2011), que “consiste no levantamento e análise de informações relacionadas a idoneidade do cliente com o credor e o mercado de crédito”. Em termos mais práticos, refere-se a observar se o cliente possui apontamentos, isto é, restritivos como: ações executivas, protestos, registros de cheques sem fundos, dívidas vencidas, bloqueios de bens, ação de busca e apreensão e até composição de dívida (renegociação de dívida).
Santos (2011) aponta que a idoneidade de um cliente pode ser classificada em 4 categorias, conforme descrito a seguir:
1. Sem restritivos: não existem informações desabonadoras do cliente no mercado de crédito;
2. Alertas: são apontamentos de natureza informativa e interna à área de crédito de cada credor, que não impedem a concessão de novos créditos. E que apenas se exige uma análise mais criteriosa. Exemplo: registro de cheque devolvido uma única vez por falta de fundos nos últimos 180 dias;
3. Restritivos: são apontamentos que indicam que o tomador possui informações desabonadoras com o credor e o mercado de crédito, representadas, em sua maioria, por registros de atrasos, renegociações e geração de prejuízos para os credores. As informações restritivas dividem-se em apontamentos de caráter subjetivo e apontamentos de caráter objetivo.
4. Impeditivos: são apontamentos que impedem o acesso do crédito ao credor por motivo de ordem legal ou normativa. Exemplos: bloqueio de bens, impedimentos no Sistema Financeiro Habitacional (SFH), proibição de concessões de crédito às pessoas físicas que tenham vínculo acionário com o credor etc.
Conforme Perera (2013): “Indivíduos com histórico de pagamentos de empréstimos satisfatórios continuam a tomar novos empréstimos.”
O terceiro ponto da análise de crédito é analisar se o cliente participa ou não de um grupo econômico, isto é, o que pode ter somente o sócio majoritário e a empresa ou várias empresas e sócios majoritários dessas mesmas. O grupo econômico também é referido na literatura como um conglomerado, um dos Cs do crédito.
Silva (2008) deixa bem claro que não se deve analisar somente a situação econômica e financeira de uma empresa, individualmente, mas sim é necessário se fazer um exame do grupo econômico como um todo. De modo que uma empresa pode ter uma outra empresa que é controladora, ou em outros casos haver empresas coligadas. E assim fazendo a análise do conjunto como um todo é possível se ter uma base da solidez do mesmo.
As empresas controladoras são aquelas que detêm mais de 50% (podendo ser 51% ou 50% mais uma ação) do controle de uma ou mais empresas. Já as coligadas são aquelas que possuem 10% ou mais de outras empresas, contudo sem haver o controle das mesmas. (SILVA, 2008)
Além disso, Silva (2008) ainda alerta que ocasionalmente “podemos encontrar situações de empresas que se apresentam com aparência aceitável para crédito e que fazem parte de um conjunto de empresas em fase de deterioração financeira”.
Silva (2008) complementa tudo o que foi posto acima, informando que:
“a análise do conglomerado, além de fornecer visão mais completa sobre a situação econômico-financeira do conjunto, bem como possibilita melhor dimensionamento do volume de crédito a ser concedido, bem como possibilita que dê tratamento uniforme a todas as empresas de um mesmo conglomerado, em termos de condições gerais de crédito, sendo benéfico tanto ao cliente quanto a quem concede o crédito”.
O quarto ponto a ser considerado em uma análise de crédito é o relacionamento que uma empresa tem com o seu credor (instituição financeira) e o mercado de crédito ou em outras palavras, a responsabilidade que ela detém com os mesmos.
Santos (2011) descreve que o relacionamento (ou responsabilidade) que o devedor tem com o seu credor (no caso uma instituição financeira) se refere às linhas de crédito utilizadas, que podem ser tanto operações de empréstimos ou de financiamentos e/ou limites de crédito. E com isso podem ser observadas se as operações estão com pontualidade ou possuem histórico de atrasos e/ou vencidos.
Além disso, o relacionamento pode também ser obtido através de informações comerciais com fornecedores ou clientes do seu próprio devedor ou também com os bureaus de crédito (tais como a Serasa, o SPC, a Equifax, o Boa Vista, entre outros) que são gestoras de informações e de risco de crédito.
Essa análise de relacionamento/responsabilidade é muito importante, porque demonstra se o devedor apresenta capacidade de pagamento, seja pontual ou não, das operações tomadas e também mostram se os valores autorizados recentemente ou de suas compras (no caso com fornecedores) no período recente estão em conformidade com a renda comprovada ou o faturamento apresentado.
É claro que sempre se deve ficar atento com as operações (ou compras) recentes para acompanhar se estão adequadas frente às necessidades e finalidades do tomador quanto aos recursos tomados. Pois, inclusive, pode haver casos em que indiquem um possível e provável golpe financeiro.
Um ponto importante a ser verificado em linhas de crédito que dispõem limites, tais como o cheque especial, o limite de cartão de crédito ou outras linhas de empréstimo e de financiamento, é observar a frequência de utilização, bem como o percentual utilizado do limite total, a evolução dos limites (se houve aumento ou redução do valor), o modo de pagamento (se foi pago o total tomado ou somente o parcial) e as taxas de juros, que no caso dos dois primeiros, geralmente são muito altas.
No caso de devedores para instituições financeiras, as mesmas classificam os primeiros quanto ao risco observado, através de um ranking de ratings, que vão de AA a H, conforme a Resolução nº 2682 (21 de dezembro de 1999) do Banco Central e a qual depois foi emitida a Circular nº 4.028 (de 23 de junho de 2000) do próprio Banco Central, que padronizou por meio da equivalência da classificação feita pelas agências internacionais de risco (Fitch, Standards & Poor’s e Moody’s) que vai de AAA a BB-, mas que no Brasil manteve-se até o rating H. Inclusive sendo que para cada nível de rating, caso houver valores em atraso, são cobradas as provisões em percentuais sobre o valor dessas operações.
Por fim, a análise financeira é imprescindível para uma boa análise de crédito. Nela, deve buscar o máximo de informações e dados atuais possíveis.
Silva (2008) relata que a análise financeira não deve ser considerada como somente uma análise das demonstrações financeiras (balanço patrimonial e demonstração de resultados do exercício) e na verdade é muito mais do que isso. Ele ainda comenta que para determinadas situações, geralmente de casos mais simples, a análise financeira deverá ser realizada sem considerar as demonstrações financeiras na mesma, devido muitas empresas de pequeno porte e em casos de pessoas físicas, autônomos, não haverá mesmo a disponibilidade e a existência de tais demonstrações financeiras. E nestes casos solicitar informações como estimativas de receitas e de despesas para poder montar um fluxo de caixa e, assim, durante o processo de análise será mais evidente saber se o “fluxo de caixa será suficiente para o pagamento das prestações” de um determinado empréstimo ou financiamento.
Além disso, ele ressalta que muitos balanços disponibilizados pelas empresas não refletem à realidade das mesmas, ou seja, são demonstrações “irreais e enganosas”. Deve-se tomar muito cuidado com isso, porque além de facilitar a concessão do crédito, pode também ocorrer tanto a piora na parte financeira (no caso da empresa tomadora já estiver em uma situação financeira debilitada) quanto o possível golpe financeiro.
Silva (2008) discorre que também deverá ser realizada uma análise setorial, que consiste conforme o mesmo em uma “apreciação macroeconômica em relação a um determinado segmento da economia”.
Silva (2008) ainda enfatiza que: “A análise setorial tende a ter maior peso na orientação de políticas de crédito que no dimensionamento do risco de uma empresa em particular”.
Na análise setorial, entender também o posicionamento da empresa no mercado de atuação é imprescindível, e para isso o analista de crédito deverá precisar estabelecer uma comparação direta entre a empresa que está sendo analisada e seus principais concorrentes, bem como observar quem são os maiores no ranking do mercado analisado.
Caso os dados não financeiros e financeiros não sejam adequados para se ter um parecer final em uma análise de crédito, também poderá ocorrer entrevista de crédito e visitas aos clientes, inclusive se houver uma proposta que seja considerada muito importante para o departamento de crédito.
A entrevista de crédito serve para obter informações com o cliente, bem como verificar o comportamento e sentir o estado de espírito do mesmo. Ela pode ser realizada por um gerente de negócios ou por um ou mais analistas de crédito. Nela, também pode ser levantada a finalidade sobre o uso que o cliente pretende fazer com o empréstimo ou financiamento, além de conseguir verificar quais as expectativas que o cliente tem sobre a empresa e o futuro da mesma, sobre o mercado e o setor de atuação. Poderão ser solicitadas maiores informações sobre os concorrentes diretos, as demonstrações financeiras, dados operacionais da atividade da empresa, e o grupo econômico. “Para isto o gerente de negócios ou o analista de crédito deve estar preparado com informações atualizadas sobre a empresa e o mercado”. (SILVA, 2008)
Aliado a tudo isso mencionado acima, o analista de crédito poderá conversar com o cliente para tentar readequar as modalidades utilizadas, bem como os valores, as garantias (colateral) e a forma de pagamento, e isso será fundamental para haver uma reestruturação financeira e melhora para o desempenho posterior da empresa (não levando em consideração choques ou eventos externos à empresa, os quais poderiam prejudicar o desempenho).
A visita ao cliente compreende três fases, as quais são: o planejamento, a realização e o acompanhamento. O planejamento constitui a etapa inicial e que deve ser definido o objetivo da visita. Esse pode ser composto por qualquer fator ou quaisquer dos fatores: “conquista do cliente, fechamento de negócios, obtenção e complementação de informações financeiras ou cadastrais, renegociação de dívida, acompanhamento e manutenção de relacionamento”. Nessa etapa, o analista de crédito deve estar preparado e munido das informações disponíveis do cliente para não haver maiores problemas e para sanar suas dúvidas e as necessidades do cliente. A realização da visita deverá cumprir o horário estabelecido (marcado), a apresentação de cada lado (tanto do entrevistador e do cliente), bem como a postura pessoal e a preparação do analista de crédito quanto às informações, dados e assuntos a serem discutidos devem ser colocados em prática. Poderão ser conversados pontos como: administração; controle e conglomerado; aspectos operacionais; aspectos mercadológicos; aspectos de natureza estratégica; aspectos tecnológicos; relacionamento bancário e aspectos relativos ao empréstimo a ser analisado. E também poderá ser solicitado ao cliente: informações atualizadas e documentos, tais como a relação de faturamento dos últimos meses, demonstrações financeiras, relatórios. Já a etapa de acompanhamento deve fazer com que as informações ora solicitadas durante o processo de visita sejam conseguidas para subsidiar a análise do crédito. (SILVA, 2008)
Após a visita, deve ser elaborado o relatório da visita, que deverá conter sucintamente as observações feitas e que complementará as informações já disponíveis do cliente. (SILVA, 2008). Além disso, o relatório da visita deverá ser arquivado juntamente com os outros documentos da empresa, bem como constar na proposta de crédito que será avaliada.
Portanto, a análise de crédito deverá ser feita com base em todos esses tópicos mencionados acima.
Santos (2011) discorre um pouco sobre os Cs do crédito.
Composição e Definição dos Cs do crédito
1. Caráter;
2. Capacidade;
3. Capital;
4. Colateral;
5. Condição.
1. Caráter
O caráter está intimamente relacionado à qualidade e à pontualidade de pagamento de operações e de dívidas do tomador de crédito. E para a análise deste C de crédito, é necessário observar as informações e o histórico do cliente tanto em nível interno quanto a nível externo.
Conforme Securato (2002): “o caráter indica a intenção do devedor em cumprir obrigações assumidas”.
Santos (2011) descreve que: “As informações históricas internas são extraídas de relatórios gerenciais do credor, onde constam registros de pontualidade, atrasos, renegociações e perdas financeiras resultantes da inadimplência do cliente”.
A nível externo é possível se basear nos relatórios de empresas especializadas em coleta e armazenamento de dados, bem como em empresas de gerenciamento de risco de crédito, tais como Serasa, SPC, Boa Vista, Equifax; e, no caso dos bancos, o próprio sistema SCR (Sistema de Crédito) do Banco Central. Neles poderão ser visualizados dados e informações desabonadoras dos tomadores de crédito, decorrentes de ações executivas, cheques devolvidos, protestos, falências e concordatas e pedidos de recuperação judicial.
2. Capacidade
A capacidade é observada e analisada com base se o tomador de recursos consegue honrar as dívidas a serem contraídas.
3. Capital
O C de capital é verificado pela análise da situação financeira do tomador (cliente), sendo que deve ser levado em conta a “composição (quantitativa e qualitativa) dos recursos, onde são aplicados e como são financiados”. (SANTOS, 2011)
4. Colateral
No mercado de crédito, o colateral refere-se a(s) garantia(s) acessória(s) oferecida(s) em uma operação de crédito. Ela é observada através do patrimônio e da reciprocidade do tomador de crédito por meio das informações passadas por ele. A riqueza do tomador de crédito deve ser avaliada com base em algumas características: se há ônus dos bens (como veículos, máquinas, equipamentos e/ou imóveis), a liquidez, o valor de mercado e estado de uso e de conservação (este último no caso de veículos, máquinas, equipamentos).
Além disso, deve-se ficar atento também quanto a constituição de determinada garantia, pois nem todo tipo de garantia pode ser atrelada em todo tipo de operação e assim, o tomador tem que observar quais seus bens e/ou direitos podem ser devidamente colocados na operação de crédito que se deseja utilizar.
Securato (2002) reforça que o “colateral refere-se a garantias que o devedor pode apresentar para viabilizar a operação de crédito”.
Garantias reais usadas como colateral são uma ideia boa para reforçar ainda mais a sua idoneidade, indicando para o ofertante de crédito que há uma boa chance de haver a liquidação do crédito (a ser tomado). Aliado a isso, vendo da ótica do ofertante do crédito, trata-se de uma prática ou estratégia para inibir ou até reduzir a inadimplência.
5. Condições
As condições se referem a variabilidade da capacidade de pagamento dos tomadores de crédito, levando em consideração efeitos ou à ocorrência de eventos externos adversos ou sistemáticos (como crises econômicas, guerras, doenças, inflação, mudanças na legislação e/ou na tributação, alterações no mercado cambial ou no mercado monetário e financeiro – neste último por meio das taxas de juros)
Além da análise financeira e dos Cs de crédito, no mercado de crédito tem que levar em consideração dois aspectos muito importantes, que são: a informação imperfeita dos agentes (informação assimétrica) e a seleção adversa.
Informação assimétrica
No mundo em que vivemos, as pessoas não têm informação sobre todas as coisas, sejam interações, transações ou das variáveis econômicas relevantes que influenciam em muito as decisões e escolhas.
E esse é o conceito de informações assimétricas. Estas fazem com que os mercados falhem e não consigam operar de forma eficiente. E ele acontece muito na economia e no mercado de crédito.
Sendo assim, as informações assimétricas ocorrem em muitas situações econômicas, tais como: “(...) o vendedor de um determinado produto conhece mais a respeito de sua qualidade do que o comprador. Os trabalhadores geralmente conhecem melhor sua destreza e habilidade do que seus empregadores”. (PINDYCK, 2002)
Além disso, “a falta de informações pode estimular os produtores a ofertar quantidades excessivas de determinados produtos e quantidades insuficientes de outros.” (PINDYCK, 2002)
Seleção adversa
A seleção adversa é uma das implicações das informações assimétricas e que consiste quando produtos e/ou serviços de qualidades distintas são comercializados pelo mesmo preço, visto que “os compradores e os vendedores não estão suficientemente informados para determinar a qualidade real do produto no momento da compra”. (PINDYCK, 2002)
No mercado de crédito, a seleção adversa se verifica devido o fato de as administradoras de cartão de crédito e os bancos não conseguirem distinguir a qualidade dos devedores/tomadores de crédito. Elas não sabem no momento das primeiras operações quais são os devedores de alta qualidade (que honram as suas dívidas) e os de baixa qualidade (inadimplentes). Logo, os bancos e as administradoras cobram a mesma taxa de juros para todos e isto faz com que haja uma maior atração dos devedores de baixa qualidade. E, por fim, os bancos acabam escolhendo, na concessão de crédito, os indivíduos e empresas que apresentam mais dificuldade financeira e de pagamento como seus clientes, de modo que também possam aumentar o volume de crédito concedido e consequentemente a sua carteira de crédito.
Somente o histórico de crédito pode fazer uma mitigação do risco dessa informação assimétrica e da seleção adversa.
Conclusão
Neste artigo, foi explicitado sobre as definições do termo crédito por alguns cientistas e pesquisadores, que em sua maioria, significa dar confiança, ou em termos mais formais o processo de análise que um credor realiza para tentar ter confiança no devedor (ou tomador de crédito) de que este honrará o compromisso financeiro. Além disso, foi discorrido sobre a finalidade do crédito, bem como a sua origem, a qual remonta desde a Antiguidade, tendo registros de dados e já utilizando taxas de juros, embora altas. Na Idade Média, com o advento e a expansão do comércio, a concessão de crédito era feita somente com o empréstimo de mercadorias e a consequente promessa de pagamento do tomador após a venda das mesmas mercadorias.
Depois, foram mostradas as teorias econômicas (clássica, keynesiana e pós-keynesiana) que deram o embasamento do crédito a uma sociedade mais moderna e que já se utilizava de meios virtuais de pagamento (como transferência bancária). A teoria clássica apresenta o mercado de crédito em decorrência do mercado de oferta e demanda por títulos, onde os demandantes (ou tomadores de crédito) correspondem às empresas e ao governo, que emitem títulos para poder captar recursos monetários para fazer frente a seus pagamentos (dispêndios) correntes e aos projetos de investimento, e os ofertantes são os indivíduos ou as famílias, que ao trocarem o seu consumo presente pelo consumo no futuro (consumo intertemporal) abrem mão de moeda e compram títulos, que pagam taxas de juros. A abordagem de Keynes é feita devido a análise do mesmo baseada no conceito de eficiência marginal do capital, explicitada no capítulo 11 da Teoria Geral, e da relação entre a moeda e outros ativos financeiros (que apresentam uma maior rentabilidade e menor liquidez que a moeda) utilizando a preferência pela liquidez, em que agentes preferem a moeda quando as expectativas quanto ao futuro estão baixas e a incerteza e o risco são maiores, isto mostrado no capítulo 17 da Teoria Geral. Os demandantes de crédito (ou tomadores de recursos para o financiamento e a aquisição de bens de capital) buscam recursos para poderem fazer frente a seus projetos de investimento e quando a eficiência marginal do capital é superior ao risco envolvido. Já os ofertantes de crédito (ou agentes superavitários) preferem obter rentabilidade através da taxa de juros e abrem mão da liquidez no curto prazo (preferência pela liquidez) e compram ativos financeiros, jogando recursos no mercado. A teoria pós-keynesiana, com base na hipótese da não neutralidade da moeda no longo prazo, descreve que os bancos ou instituições financeiras administram a oferta do crédito por meio da gestão eficiente tanto de seus ativos quanto de seus passivos e mediante a escolha do tradeoff liquidez versus rentabilidade, utilizando a preferência pela liquidez em um cenário incerto e arriscado de crise econômica, racionando crédito; e quando está em um cenário de crescimento econômico busca rentabilidade (podendo usar a seleção adversa), aumentando a concessão, de forma a poder atender a uma maior demanda por crédito.
E por último foi apresentada a análise de crédito, que consiste na coleta de dados e de informações do tomador de crédito pelo credor, bem como na avaliação e análise desses dados, de modo que pudesse chegar a um parecer, sendo favorável ou desfavorável.
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* Mestrado em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP).
Pós-Graduação Lato Sensu (Especialização em Mercados Financeiros) e
Graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.